Justiça derruba sigilo e revela motivação pelo afastamento do prefeito de Pacaembu
Denúncia envolve despesas irregulares em viagens realizadas pelo prefeito, secretários e vereadores.
Foi suspenso o sigilo judicial da ação civil de improbidade administrativa (Processo 1000288-61.2020.8.26.0411) movida pelo Ministério Púbico do Estado de São Paulo (MPSP), que levou afastamento judicial do prefeito de Pacaembu Maciel Colpas (PSDB), ocorrido nesta terça-feira (10). O prefeito foi notificado pela manhã da decisão judicial e logo em seguida foram notificados a Câmara Municipal e o Cartório Eleitoral (reveja), e até então existia sigilo judicial.
Além do acesso à sentença, no site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, o SIGA MAIS obteve cópia da inicial apresentada pelo MPSP, onde detalha a denúncia e a participação de cada um dos envolvidos. A Promotoria de Justiça chegou a requerer às operadoras de telefonia – com autorização judicial – informações sobre a localização de três dos envolvidos nas datas em que foram realizadas as viagens, para confrontar se, de dato, estavam nos locais declarados.
A denúncia
O início da sentença do Poder Judiciário que determinou o afastamento do prefeito de Pacaembu é iniciada com uma síntese da acusação formulada pelo MPSP, onde alega que a municipalidade de Pacaembu, na gestão do atual prefeito Maciel Colpas, teria custeado irregularmente diversas viagens do próprio chefe do executivo, das secretárias municipais Gisele Aparecida Garcia Colpas (esposa do prefeito e que ocupava o cargo de secretária municipal de assistência social), Manuelina do Carmo Colpas (irmã do prefeito e que ocupava o cargo de secretária municipal de saúde), bem como dos vereadores Aparecido Donizeti Frias (PMDB), José Messias Fagundes de Almeida (PSDB), Marcos Leandro Lourencetti (PP) e Valdecir Pessan (PSDB), onde João Nabor Zanetti (secretário municipal de administração e finanças), Sivaldo Sanches de Magalhães (assessor técnico de planejamento e orçamento), Maura Regina Meneguello Pereira (assessora de recursos humanos) teriam sido coniventes com a efetivação dos gastos de viagens que, segundo o MPSP, sabiam ser irregulares. Ainda de acordo com a denúncia da Promotoria, o Hotel King, na capital paulista, teria emitido notas fiscais "frias" de hospedagem, em valores superiores às diárias. “Em razão da conduta dos requeridos, ímproba, houve enriquecimento indevido, dano ao erário público e causou, inclusive, dano moral coletivo”, narra a sentença.
Segundo continua o texto da sentença, o prefeito Maciel Colpas foi ouvido nos autos onde argumentou pelas conquistas decorrentes das viagens, na tentativa de justificar as despesas contraídas e interpretadas como irregulares pelo MPSP.
Já na sequência, o juiz iniciou sua argumentação e fundamentou a decisão, onde cita que foram analisadas 39 viagens realizadas com o emprego de dinheiro público. “Compulsando-se os autos, numa análise superficial, verifica-se a irregularidade nos gastos com viagens pela municipalidade de Pacaembu”, afirma. “Várias viagens foram realizadas pelo requerido Maciel juntamente com os vereadores requeridos, sendo as despesas custeadas pelo executivo [...], de forma irregular, seja por falta de embasamento legal, seja porque executivo e legislativo possuem orçamento próprio”, continua. “Ou seja, o chefe do executivo, valendo-se do exercício do cargo, em aparente ajuste de interesses, custeou as viagens dos requeridos citados e, ainda, obteve supostas "notas frias" do hotel requerido, em valor muito superior às respectivas diárias”, afirma o magistrado.
Em relação aos três secretários municipais o juiz escreveu: “Quantos aos requeridos Maura, Sivaldo e João, suas condutas são aparentemente irregulares, uma vez que, funcionários públicos encarregados de zelar pela regularidade dos gastos públicos, apesar de cientes, foram, no mínimo, coniventes com as condutas perpetradas pelo chefe do executivo”.
Já em relação ao Hotel King, o juiz afirmou que houve emissão de notas fiscais em valores acima dos praticados pelo estabelecimento. “Por fim, no que se refere ao hotel requerido, evidente os indicativos de ilicitude de conduta, dada a demonstração da emissão de supostas notas em valores superiores aos gastos efetivos”.
Para o magistrado, “tais situações, no mínimo e por certo, importam e enriquecimento indevido, prejuízo ao erário, e arranham os princípios da moralidade e legalidade administrativa, que devem permear a atuação do agente público”. (Continua após a publicidade...)
Em outro momento da sentença o juiz expõe sobre a legislação que autoriza o afastamento do agente público quando a medida se fizer necessária à instrução processual, conforme previsto no artigo 20, parágrafo único, da Lei 8.429/92. “Nos autos, há evidências de que a permanência de Maciel no cargo de prefeito municipal, neste momento, ameaça a lisura da instrução do presente feito”, afirma. “A própria condição de chefe do executivo, no comando das atividades da municipalidade, já é suficiente para causar risco à instrução processual, pois o Prefeito pode se valer da hierarquia do cargo para intimidar testemunhas ou forjar/alterar provas documentais, essenciais para o deslinde da questão posta em juízo”, continua. “Ademais, a conduta do prefeito acusado causa grave dano à ordem pública, a moralidade e lesão à economia pública”, completa o magistrado.
Afastamento e bloqueio de bens
Ao final da sentença, o juiz detalhou sua decisão, onde determinou o bloqueio de bens do prefeito de Pacaembu, Maciel Colpas e seu afastamento do cargo, bem como o bloqueio de bens de outras nove pessoas, sendo elas os secretários municipais Gisele Aparecida Garcia Colpas, Manuelina do Carmo Colpas, João Nabor Zanetti, Sivaldo Sanches de Magalhães e Maura Regina Meneguello Pereira, e os quatro vereadores Aparecido Donizeti Frias, José Messias Fagundes de Almeida, Marcos Leandro Lourencetti e Valdecir Pessan, bem como do King Hotel.
A notificação ao prefeito, sobre seu afastamento, foi cumprida por oficial de Justiça na manhã desta terça-feira. E a posse do vice-prefeito, Adão Viscardi (PV), ocorreu às 17h, em sessão extraordinária convocada pela presidente da Câmara Municipal de Pacaembu.
O prefeito Maciel Colpas deve recorrer da decisão junto a instâncias superiores do Poder Judiciário do Estado de São Paulo.
Outro lado
O Poder Executivo de Pacaembu divulgou uma nota oficial onde a Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos informa que o prefeito afastado ingressará com recurso em pedido de liminar junto ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), “na plena certeza de que a corte superior reverterá a decisão da Justiça da Comarca e o retornará ao cargo”.
De acordo com a nota, “É necessário contextualizar que a base da ação proposta pelo Ministério Público por meio da Promotoria de Justiça de Pacaembu é sustentada em denúncia de dois vereadores que fazem um trabalho declarado de oposição ao prefeito e, também, na ocupação de cargos públicos já fizeram viagens ou geraram despesas ao município muito superiores e mais suspeitas do que essas que eles próprios denunciaram ao MP”, informou a Prefeitura.
“Sendo assim, todos os documentos relacionados a esses fatos já estão sendo levantados e em breve serão encaminhados para providências legais do Ministério Público do Estado de São Paulo”, finalizou o Poder Executivo.
Conteúdo atualizado às 19h11 de 10/03/2020 para inclusão da posição oficial, em nota, sobre as medidas que serão tomadas pelo prefeito afastado.