Sob calor intenso, moradores de Adamantina vivem drama e descaso com falta de água
Moradores vão buscar água em balde em horta comunitária. Situação é desumana em dias de forte calor.
Moradores de Adamantina, sobretudo os bairros mais às extremidades, têm convivido nos últimos dias com a falta de água nas torneiras. Residentes no Jardim Adamantina e representantes da Associação de Moradores do bairro ouvidos na manhã deste domingo (24) pelo SIGA MAIS narraram a situação como dramática e de descaso. Eles relatam que buscaram os canais da empresa de abastecimento reclamando da falta de regularidade no abastecimento de água, e são informados que a situação está normal. Na cidade o serviço é operado pela Sabesp.
A reportagem foi ao local após constatar repetidas postagens de reclamações sobre falta de água em suas casas, o que tem sido frequente e diário ao longo dos últimos dias, sobretudo na última semana. O Jardim Adamantina tem sido uma das regiões mais afetadas, o que também ocorre no Parque Itaipus e Jardim Primavera, bairros vizinhos.
Nas rede sociais o SIGA MAIS também identificou relatos de moradores da Vila Jamil de Lima, Parque do Sol, Jardim Brasil e Jardim Bela Vista, com a mesma queixa: falta de água nas torneiras, o que ocorre sobretudo a partir do período da tarde, deixando os imóveis desabastecidos. Quem não tem reservatório em casa, ou é de pouca capacidade, fica por horas sem água para as tarefas corriqueiras do cotidiano.
Reservatório elevado da Sabesp na Rua Rui Barbosa (Siga Mais).
Na manhã deste domingo no Jardim Adamantina, a reportagem verificou relatos semelhantes, de moradores residentes em diferentes pontos do bairro. As reclamações estão entre aqueles que trabalham o dia todo e ao retornar para casa estão sem água para o banho, como também os cuidados com crianças e idosos. Tarefas do dia a dia, como lavar louças na cozinha, lavar roupas e limpar a casa ficam prejudicadas sem água.
Conforme os moradores, a falta de água que tem se repetido nos últimos dias começa a ocorrer em diferentes momentos, conforme a localidade da residência. Há relatos de falta de água já pela manhã, mas a maioria dos problemas têm ocorrido no período da tarde, quando as torneiras ficam secas. Em horários de pico, quando muitos trabalham foram e voltam para casa no início da noite, falta água. “A gente chega em casa para tomar banho, e nada”. Nesse calor é uma condição desumana”, reclamou o grupo. “Trabalhamos, pagamos a conta em dia e nessas horas precisamos usar a água e não tem”, reiteram. Geralmente, no fim da noite, a água começa a voltar às torneiras, e no outro dia o drama se repete.
15 horas com torneiras secas, foi buscar água com balde na horta comunitária
Um caso que chamou a atenção, no Jardim Adamantina, é da moradora Cleusa José Batista. Ela tem o marido doente, com Alzheimer. Conforme relatou, neste sábado (23) constatou falta de água em sua casa por cerca de 15 horas seguidas. “Às nove horas da manhã não tinha água na torneira da rua, que voltou por volta da meia noite”, disse.
Cleusa foi buscar água na horta comunitária (Siga Mais).
Nesse período, diante da necessidade de água, sobretudo para os cuidados com o marido, ela foi buscar com baldes na horta comunitária do bairro, onde há um poço artesiano, e fez reserva em casa, em vasilhas, para se garantir.
O diretor de patrimônio da Associação de Moradores do Jardim Adamantina, Aparecido Sereno do Nascimento, contou que inclusive à noite a horta comunitária foi acessada por moradores, em busca de água em baldes e galões. “Ainda bem que temos a horta no bairro, com poço artesiano, condição que permitiu socorrer nossos moradores”, contou.
Ausência das autoridades e da empresa, e falta de comunicação
Os moradores ouvidos na manhã deste domingo foram unânimes ao afirmar a falta de ação das autoridades, mesmo após frequentes reclamações. Eles também apontam a falta de comunicação da empresa de abastecimento de água, cobrando mais clareza, objetividade e transparência nas informações sobre o que estaria desencadeando esse problema. “Em dias com falta de água, por exemplo, era para ter uma campanha orientando as pessoas para economizar e usar com prioridade, para não lavar carros e quintais, entre outros usos que podem ser deixados para depois. E não ouvimos nada disso. Somos tratados com desrespeito e falta de consideração, porque também pagamos pela água, e no nosso caso, não somos servidos com a regularidade que queríamos”, relatam. “E curiosamente, a mesma água não falta em outros bairros. Por que acontece aqui”, questionam? Com esse relato, os moradores se sentem excluídos do serviço.
Eles apontaram ainda questões da organização funcional, ligadas à operação dos serviços. Para eles, a terceirização de diferentes frentes na empresa de abastecimento não repercute em compromisso institucional com os serviços e com a resolutividade da deficiência no fornecimento de água, que tem sido comum no bairro.
Moradores afetados cobram informações e providências (Siga Mais).
Diante da ausência de posições das autoridades, os moradores, por meio da Associação de Moradores, sinalizam que poderão ingressar com reclamações formais junto ao Procon, pontuando falha na prestação dos serviços de abastecimento de água, já que há uma relação de consumo firmada entre a empresa e os clientes, como também junto ao Ministério Público. Caso a reclamação chegue ao Procon e o órgão dê encaminhamento ao tema, as demandas poderão eventualmente implicar em multas e outras obrigações à empresa. Junto à promotoria, uma eventual reclamação fundamentada, poderia ensejar um termo de ajustamento de conduta e/ou sua representação na esfera judicial. Na Justiça, dependendo do caso e da interpretação do magistrado, poderia ocorrer de ser determinada a obrigação de fazer, à empresa, para a execução de investimentos que ampliem a capacidade operacional, no atendimento aos moradores/clientes.
Valor das tarifas, ar nas torneiras e pressão fraca
Ainda no domingo os moradores apontaram o valor das tarifas cobradas no município, pela empresa. Eles consideram o valor alto, e a insatisfação aumenta diante da falha no fornecimento da água. “Pagamos caro e não recebemos a água”. Outro ponto de preocupação é com a passagem de ar pelas torneiras, quando o abastecimento volta a ser estabelecido. Os moradores questionam se esse ar, que faz o mostrador do hidrômetro girar, gera cobrança na fatura mensal da conta de água.
Além da falta de água no Jardim Adamantina, outro problema frequente, também reclamado, é a baixa pressão da água que sai nas torneiras, vinda da rua. Essa condição de baixa pressão é de longa data, também sem solução por parte da empresa que opera os serviços de água e esgoto na cidade. A pressão da água depende de diferentes fatores da estrutura de distribuição, e há mecanismos de controle desse sistema.
Sem investimento em novo reservatório, atual estrutura não dá conta da demanda
Conhecedores do tema consultados pelo SIGA MAIS apontam a necessidade de investimentos, sobretudo para ampliar a capacidade de reservação da água produzida em Adamantina, para atender a demanda da cidade. Nas duas últimas décadas houve uma expressiva expansão urbana, com novos loteamentos. Porém a capacidade de reservação da água não acompanhou.
Um exemplo é o Jardim Adamantina, e seu bairro vizinho mais antigo, o Jardim Primavera. Ao longo dos últimos anos, apenas no entorno, três novos bairros foram instalados (Itaipus, Universitário e Residencial Rio Branco). Na cidade toda, são vários os novos empreendimentos habitacionais, sem que a reservação de água acompanhasse esse crescimento.
Área da horta que teria sido indicada para receber um novo reservatório de água (Siga Mais).
No Jardim Adamantina, por exemplo, há promessa antiga, para construção de novo reservatório, que poderia sanar esses problemas, e há inclusive área indicada para receber essa estrutura: uma faixa de terras da área da horta municipal. Porém, não houve nenhum avanço.
Problema da falta de reservação está em contrato, aponta documento
A deficiência da estrutura de reservação da água que abastece Adamantina é de conhecimento do poder púbico municipal e da empresa que opera os serviços na cidade. No Contrato de Programa assinado em 2011, nas metas de abastecimento de água que fazem parte do Plano Municipal de Saneamento Básico contido na Lei Complementar Nº 149, de 19 de outubro de 2010, o item 11.1.2, disposto na página 150 do arquivo em PDF, trata da necessidade de aumentar o nível de reservação no município. “Um cálculo aproximado indica que os níveis de reservação não são suficientes para suprir a população durante 24 horas. É necessário que sejam aumentadas as reservas de água do município para um nível que atenda o abastecimento da cidade por pelo menos 72 horas. Prazo esse que deve ser firmado para a resolução dos problemas”, informa o documento. “A concessionária deverá apresentar o planejamento para a ampliação das reservas de água, nos parâmetros acima citados, no ato da contratação, contendo também ações para emergências e contingências, como: Rodízio de poços, cronograma de perfuração de novos poços, programa de recuperação e tratamento de águas superficiais para distribuição a rede.
Veja a íntegra desse ponto do Plano Municipal de Saneamento Básico:
Trecho dos documentos do contrato de programa vigente (Reprodução).
O contrato assinado em 2011 tem vigência de 30 anos, prazo para que as obrigações firmadas sejam cumpridas.
Água da cidade é produzida em nove poços e armazenada em sete reservatórios
Atualmente, segundo informa o site da Sabesp, Adamantina é abastecida por nove poços e a água produzida é armazenada em sete reservatórios, com capacidade de reservação de 3.9 milhões de litros. No município são 16.111 ligações de água.
Trecho dos documentos do contrato de programa vigente (Reprodução).
Os sete reservatórios estão na Rua Arno Kieffer (dois reservatórios enterrados), Rua Rui Barbosa (um enterrado e um elevado), um na Rua Heitor Freire de Carvalho (elevado), um na Rua Germano de Vasconcelos, no Jardim Bela Vista (apoiado) e um no bairro Lagoa Seca (apoiado).