Ao resistir à decisão que não referendou reitores, prefeito se põe contra lei criada por ele em 2017
Atual mandato da reitoria termina na próxima quarta-feira e cenário ainda é incerto.
A posição do prefeito de Adamantina em resistir à decisão em plenário, na Câmara Municipal, que na última segunda-feira (21) rejeitou os nomes para reitor e vice-reitor indicados por ele, para assumirem a reitoria do Centro Universitário de Adamantina (UniFAI) no quadriênio 2021/2025, mostra contradição do chefe do poder executivo municipal.
A postura de Márcio Cardim se opõe à Lei Complementar Municipal Nº 274, de 25 de maio de 2017, de sua autoria, aprovada pela Câmara Municipal e depois sancionada e promulgada também por ele, que dispõe sobre o estatuto, a estrutura administrativa e acadêmica e organiza o quadro de pessoal das Faculdades Adamantinenses Integradas, transformadas pela mesma lei em Centro universitário.
No Capítulo III da Lei Complementar Nº 274, o Artigo 5º trata objetivamente da forma de eleição do reitor e vice-reitor da autarquia. O mesmo artigo também trata da autonomia do Centro Universitário:
“Art. 5º - Os empregos em comissão de Reitor e de Vice-Reitor, do Anexo I, são de nomeação do Prefeito do Município, escolhidos em lista tríplice elaborada pelo Conselho Universitário, ad referendum da Câmara Municipal, para um mandato de 04 (quatro) anos, permitida uma única recondução, respeitadas a autonomia do Centro Universitário e as normas estabelecidas pelo seu Regimento Interno aprovado pelo Conselho Estadual de Educação”.Ponto crítico
O processo de eleição para a reitoria da UniFAI foi aberto no dia 28 de abril com o prazo de inscrição das chapas em 21 de maio. Duas chapas se inscreveram.
A chapa com os nomes dos indicados foi definida no dia 28 de maio, em votação pela comunidade acadêmica da instituição de ensino, representada pelo Conselho Universitário. Ao final da eleição interna, lista tríplice foi encabeçada pelos professores doutores Alexandre Teixeira de Souza para reitor e Wendel Cleber Soares vice-reitor, que obtiveram a primeira colocação, com 12 votos.
Depois, a lista tríplice foi encaminhada ao prefeito, que não acolheu os nomes mais votados pelo Conselho Universitário e decidiu indicar a chapa que ficou em segundo lugar, com 6 votos, formada pelos professores doutores Vagner Amado Belo de Oliveira para reitor e Albanir Gabriel Borrasca para vice-reitor.
A escolha do prefeito não ilegal e está amparada em lei, já que fez a indicação a partir dos nomes que constam da lista tríplice. Porém, rompeu com uma tradição onde o Poder Executivo Municipal – mantenedor da UniFAI – sempre reconheceu os nomes com maior votação no colegiado para dirigir a instituição. O prefeito já foi diretor da mesma instituição de ensino e conhece o rito.
Em paralelo, a mesma legislação que ampara a prerrogativa do prefeito em escolher os nomes que constam da lista tríplice, e não necessariamente o mais votado, também exige que a indicação seja submetida ao plenário do Poder Legislativo, para referendo. A nomeação do reitor e vice-reitor só pode ocorrer ad referendum, o que foi votado na noite desta da última segunda-feira (21), e rejeitado.
O cenário se mostra crítico, delicado e ainda incerto. O atual mandato da reitoria da UniFAI termina na próxima quarta-feira (30).
Como fica?
Com a rejeição dos nomes indicados pelo prefeito na Câmara, a situação inédita na história da autarquia passou a exigir novos desdobramentos, às pressas, já que o atual mandato termina na próxima quarta-feira. Com a rejeição da primeira indicação do prefeito, o mesmo precisaria fazer nova indicação ao legislativo, considerando os nomes que fazem parte da lista tríplice elaborada por meio de votação no Conselho Universitário, e novamente submeter os nomes à Câmara Municipal.
Judicialização
Desde a última segunda-feira, após a sessão, um dos caminhos que o prefeito poderia seguir é a judicialização, como abordou o SIGA MAIS logo após a votação do referendo. Essa possibilidade também foi abordada neste sábado (26) em uma reportagem do jornal Folha Regional.
Resistente à decisão que rejeitou os nomes da chapa que escolheu, o prefeito não procedeu uma segunda indicação à Câmara. E também, formalmente, não divulgou qualquer mobilização jurídica para tentar decidir esse tema no Poder Judiciário, seja por mandado de segurança, embargos ou outros instrumentos jurídicos, onde precisará argumentar para convencer a Justiça.
Pró reitor poderá assumir reitoria
Se não houver pelo prefeito a indicação dos novos nomes que compõem a lista tríplice, à Câmara – que ainda precisará votar um novo referendo – e se o mesmo tentar buscar alguma medida judicial que eventualmente não tenha decisão liminar ou outro aval do Judiciário até 30 de junho, uma das possibilidades é invocar o § 6º do Artigo 15 do Regimento Geral da UniFAI, conforme versão reformulada definida pela Resolução nº 08 de 16 de dezembro de 2019:
“§ 6º - No caso de vacância simultânea das funções de Reitor e de Vice-Reitor, até que haja a nomeação dos novos Reitores, responderá pela direção do Centro Universitário, o Pró-Reitor com mais tempo de exercício nesta Autarquia ou seu subsequente, nos casos de recusa ou impedimento, respeitados os requisitos legais do cargo”.
Com essa previsão, especialistas da área jurídica ouvidos neste sábado pelo SIGA MAIS apontam que vencidos os mandatos do atual reitor e vice-reitor, poderá eventualmente ser reconhecida a vacância e o pró-reitor com mais tempo de casa assume temporariamente a direção da UniFAI.
Atualmente, segundo informa a própria autarquia, há dois pró reitores nomeados. Um deles é o candidato que lidera a chapa indicada pelo prefeito, professor doutor Vagner Amado Belo de Oliveira, pró reitor de extensão. O segundo é o professor doutor Delcio Cardim, pró reitor de ensino. Vagner ingressou na UniFAI em 8 de agosto de 2011 e Delcio em 16 de abril de 2001. Portanto, nessa hipótese, Delcio poderia assumir, bem como recusar-se ou ser considerado impedido, o que abriria caminho para a nomeação temporária de Vagner Oliveira.
Juridiquês: definição técnica de ad referendum
Um dos pontos críticos na queda de braço entre Câmara Municipal e prefeito está a conceituação da expressão ad referendum, mencionada objetivamente na Lei Complementar Municipal que trata do processo de eleição dos novos reitor e vice-reitor da UniFAI. A Lei diz que o prefeito tem a prerrogativa de nomeá-los, a partir da lista tríplice, “ad referendum da Câmara Municipal”.
A expressão em latim significa “para apreciação” ou “para aprovação”, sendo utilizada para atos que são dependentes de uma ratificação de autoridade ou poder competente para que sejam válidos. A Lei Complementar Municipal é objetiva ao mencionar a Câmara Municipal como poder competente para referendar a escolha dos novos reitores.
O SIGA MAIS pesquisou sobre o termo jurídico e encontrou duas referências seguras sobre o terma. A primeira delas é mencionada no glossário jurídico do Supremo Tribunal Federal (STF): “Diz que a decisão foi tomada ad referendum, quando ela depende de ser referendada pelo órgão que possui competência para tanto”.
(Reprodução).
No Ministério Público Federal (MPF) do Espírito Santo, a expressão também tem tradução objetiva: “para aprovação”.
Processo eleitoral polêmico
Os nomes para a reitoria da UniFAI - professores doutores Vagner Amado Belo de Oliveira para reitor e Albanir Gabriel Borrasca para vice-reitor - foram indicados na última quarta-feira (16) pelo prefeito Márcio Cardim. A chapa ficou em segundo lugar, em votação no Conselho Universitário da instituição, com 6 votos. Já a chapa que encabeçou a votação no Conselho, e abre a lista tríplice, é formada pelos professores doutores Alexandre Teixeira de Souza e Wendel Cleber Soares.
Márcio Cardim foi diretor da mesma instituição de ensino e já vivenciou o rito de nomeação. Sua decisão em não indicar à reitoria a chapa que encabeçou a lista tríplice causou reações na cidade. Na quinta-feira (17) pela manhã, um dia após o anúncio, uma carreata organizada por estudantes da UniFAI percorreu as ruas da cidade, em protesto. Sem seguida, na sexta-feira, uma Carta Aberta aos vereadores foi publicada pelo Centro Acadêmico da instituição, com críticas à decisão do prefeito.
E na noite da votação, nesta segunda-feira, um ato público também movimentou as proximidades da Câmara Municipal. Um grupo de estudantes da UniFAI se concentrou na esquina da Praça Élio Micheloni. Os estudantes seguram as orientações pelo distanciamento social. Eles faziam barulho e gritavam palavras dirigidas aos vereadores.
Veja a cronologia
• UniFAI publica resolução e abre prazo para candidaturas à reitoria 2021/2025
• Eleição da nova reitoria da UniFAI: reitor Paulo Sérgio da Silva anuncia que não vai concorrer
• Duas candidaturas pleiteiam a reitoria da UniFAI para o quadriênio 2021/2025
• Futuro da UniFAI: conheça os planos de gestão dos candidatos à reitoria 2021/2025
• Conselho Universitário da UniFAI define nesta sexta-feira nomes da lista tríplice à nova reitoria
• Alexandre Teixeira e Wendel Cleber Soares encabeçam lista tríplice para nova reitoria da UniFAI
• Prefeito ignora mais votado no Conselho Universitário e indica 2º colocado para reitor da UniFAI
• Um dia após anúncio dos nomes indicados pelo prefeito à reitoria da UniFAI, estudantes protestam
• Nomeação da nova reitoria da UniFAI: Centro Acadêmico publica Carta Aberta aos vereadores
• Em votação, maioria da Câmara rejeita indicação do prefeito à reitoria da UniFAI
• Com votos do Podemos, PV e do próprio DEM, nomes indicados pelo prefeito à reitoria são rejeitados
• PV orientou vereadores do Partido a rejeitarem nomes indicados pelo prefeito à reitoria da UniFAI
• Há 5 dias do fim do mandato da reitoria da UniFAI, situação sobre futuro reitor ainda é indefinida